terça-feira, 25 de junho de 2013

Estátua egípcia roda sozinha 180º

Estátua do Antigo Egipto, encontra-se no Museu de Manchester, nos Estados Unidos, há mais de 80 anos (modifiquei a foto digitalmente, para assinalar a estátua com uma linha curva fechada). - Sábado.pt
No Museu de Manchester, nos Estados Unidos, a estátua de um homem chamado Neb-Senu, encontra-se em exibição há mais de 80 anos. A relíquia foi uma oferta ao deus egípcio Osíris, o deus dos mortos. Tudo decorria com normalidade, até ao dia em que os trabalhadores do museu, verificaram que a estátua aparecia virada ao contrário. A estátua está num armário fechado. A única pessoa que tem a chave, o egiptólogo Campbell Price, afirmou que a colocava direita, mas no dia seguinte ela estava virada ao contrário.

Decidiram montar câmaras de video e aguardar. Viram então, a estátua a girar sozinha, num circulo perfeito, 180º. Vários cientistas já se pronunciaram sobre o fenómeno, avançando com explicações racionais, mas, a parte sobrenatural não ficou excluída.

A estátua esteve sempre no mesmo local dentro do museu e nunca se moveu até agora. Veja o vídeo e a notícia completa, Sábado.pt


A estátua egípcia gira num circulo perfeito, sem que ninguém lhe toque (modifiquei a foto digitalmente, para assinalar a estátua com uma linha curva fechada).   Sábado.pt

sexta-feira, 21 de junho de 2013

Evocar Fernando Pessoa no seu 125º aniversário

Fernando Pessoa, 1914

Fernando António Nogueira Pessoa, foi um dos maiores poetas da Língua Portuguesa. Nasceu a 13 de Junho de 1888, no Largo de São Carlos, em Lisboa. O pai, Joaquim de Seabra Pessoa, natural de Lisboa, para além de funcionário público, era crítico musical no Diário de Notícias. A mãe, Maria Madalena Pinheiro Nogueira, natural dos Açores (Ilha Terceira), beneficiou de uma refinada educação. 
O baptismo de Fernando Pessoa, foi celebrado na Igreja dos Mártires (Chiado), no dia 21 de Julho de 1888. A escolha do nome homenageia Santo António, nome de baptismo Fernando de Bulhões, festejado em Lisboa a 13 de Junho - no poema "Praça da Figueira", o poeta fala sobre "o meu santo".

"Santo António"

Nasci exactamente no teu dia -
Treze de Junho, quente de alegria,
Citadino, bucólico e humano
Onde até esses cravos de papel
Que têm uma bandeira em pé quebrado
Sabem rir...
Santo dia profano
Cuja luz sabe a mel
Sobre o chão de bom vinho derramado!

Santo António, és portanto
O meu santo,
Se bem que nunca me pegasses
Teu franciscano sentir,
Católico, apostólico e romano.

(Reflecti.
Os cravos de papel creio que são
Mais propriamente, aqui,
Do dia de S. João...
Mas não vou escangalhar o que escrevi.
Que tem um poeta com a precisão?)

Adiante. . . Ia eu dizendo, Santo António,
Que tu és o meu santo sem o ser.
Por isso o és a valer,
Que é essa a santidade boa,
A que fugiu deveras ao demónio.
És o santo das raparigas,
És o santo de Lisboa,
És o santo do povo.
Tens uma auréola de cantigas,
E então
Quanto ao teu coração —
Está sempre aberto lá o vinho novo. 
...............................................
...................................................

Fernando Pessoa

Praça da Figueira
09-06-1935 (aqui, Casa Fernando Pessoa)

Retrato de Fernando Pessoa, óleo sobre tela, 1964. Pintura José de Almada Negreiros - FCG, Centro de Arte Moderna, Lisboa
O pai faleceu em 1893, com 43 anos, vítima de tuberculose. Fernando tinha apenas cinco anos - a primeira quadra "À minha mamã", foi escrita aos sete anos de idade. Em 1895, dois anos após o falecimento do seu pai, a mãe casou-se pela segunda vez, por procuração, com o comandante João Miguel Rosa, cônsul de Portugal em Durban, África do Sul. Em razão do casamento, Pessoa viajou com a mãe para Durban, no ano seguinte. Em África, onde passou a maior parte da juventude (1896-1905) e fez os seus estudos em escolas inglesas (High School), Pessoa viria a receber o Prémio Rainha Victoria, em 1904.

"À minha mamã"

Eis-me aqui em Portugal
Nas terras onde eu nasci
Por muito que goste delas
Ainda gosto mais de ti. 

Fernando Pessoa
26-07-1895 (aqui, Casa Fernando Pessoa)


Heterónimos de Fernando Pessoa: Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos. Desenhos de José de Almada Negreiros. Pormenor da fachada gravada da Faculdade de Letras da U.C.L., 1957-61. França, J. Augusto (1974), Almada o Português Sem Mestre. Lisboa: Estúdios Cor.
Pessoa regressou a Lisboa em Agosto de 1905, para frequentar o curso Superior de Letras da Universidade de Lisboa, vindo a abandoná-lo sem realizar um único exame. Frequentou a Biblioteca Nacional, onde leu livros de literatura, sociologia, filosofia, religião, a fim de aperfeiçoar a sua cultura e estudar a Lingua Portuguesa. Desde muito jovem, os seus textos e poemas eram escritos em inglês, devido à sua educação. Por volta de 1910, já escrevia muito em Português. Fernando Pessoa traduziu diversas obras portuguesas para inglês, de autores como António Botto e Almada Negreiros. 
Ao longo da sua vida, trabalhou fazendo traduções e redacções de cartas em inglês e francês, para firmas portuguesas com negócios no estrangeiro.

"Meia-Noite"
As louras e pálidas crianças
—Dlon...
Desprendem a chorar suas tranças
— Dlon...
Quem nos dirá donde é esse pranto
—Dlon...
Sabê-lo tirar-lhe-ia o encanto
—Dlon...
Que fique sempre como elas vago
—Dlon...
Folha caída à tona do lago
—Dlon...
Que nos inspire e o não percebamos
— Dlon...
Que só se sinta em nós que o amamos
—Dlon...
Que seja para nós som de fonte
— Dlon...
Que seja o mistério do horizonte
—Dlon...
Tristeza que dorme em vale e monte
Dlon...
Tristeza vaga, dor, vago som
Dlon...
Fernando Pessoa
15-02-1912 (aqui, Casa Fernando Pessoa)


Fernando Pessoa Não-Ele-Mesmo, óleo sobre tela, 1976. Pintura de António Costa Pinheiro. Colecção do artista. Foto de Manuel Shnell -  Pinto e Almeida, Bernardo (2005), Costa Pinheiro. Lisboa: Caminho. Edimprensa: Paço de Arcos.

Fernando Pessoa era reservado e solitário por natureza, no entanto, manteve convívio com algumas das mais notáveis figuras da literatura portuguesa. Frequentava os cafés "A Brasileira" e o "Martinho da Arcada", onde se encontrava com os amigos, como Mário de Sá-Carneiro, Santa-Rita Pintor e Almada Negreiros. Respeitado como intelectual e como poeta, publicou regularmente a sua obra literária em verso e em prosa. Publicou "35 Sonnets" (em inglês), 1918; "English Poems I-II" e "English Poems III" (em inglês também), 1922. Entre 1912 e 1934, colaborou como ensaísta e crítico literário na revista A Águia, do Porto, dirigiu a revista literária Orpheu, lançou a revista Athena, colaborou na Contemporânea, na Presença, no Diário de Lisboa e no Tempo. O livro "Mensagem", 1934, foi premiado pelo "Secretariado de Propaganda Nacional" na categoria Poema. Fernando Pessoa foi um líder activo do modernismo em Portugal, inventando também outros movimentos de inspiração cubista e semi-futurista. 


"Gato que brincas na rua"
Gato que brincas na rua 
Como se fosse na cama, 
Invejo a sorte que é tua 
Porque nem sorte se chama.
 
Bom servo das leis fatais 
Que regem pedras e gentes, 
Que tens instintos gerais 
E sentes só o que sentes.
 
És feliz porque és assim, 
Todo o nada que és é teu. 
Eu vejo-me e estou sem mim, 
Conheço-me e não sou eu.

Fernando Pessoa
Janeiro de 1931 (aqui, Casa Fernando Pessoa)

Fernando Pessoa-Heterónimo, óleo sobre tela,1978. Pintura de António Costa Pinheiro - FCG, Centro de Arte Moderna, Lisboa
O Chapéu-Heterónimo do poeta Fernando Pessoa, óleo sobre tela, 1979-1980. Pintura de António Costa Pinheiro. Colecção do artista. Foto de Manuel Shnell -  Pinto e Almeida, Bernardo (2005), Costa Pinheiro. Lisboa: Caminho. Edimprensa: Paço de Arcos.
Óculos do Poeta Álvaro de Campos - Heterónimo de Fernando Pessoa, óleo sobre tela, 1980 - FCG, Centro de Arte Moderna, Lisboa
Em Novembro de 1919, Fernando Pessoa conheceu Ofélia Queiróz - que viria a ser sua namorada - na firma Félix, Valladas & Freitas, Lda., onde ambos trabalhavam.
Após a morte (1919) do segundo marido da mãe de Fernando Pessoa, esta regressa a Lisboa. A família vai morar para um andar alugado por Pessoa, na Rua Coelho da Rocha, nº 16  (hoje Casa Fernando Pessoa), em Lisboa, onde o poeta viveria até à sua morte. Depois de morar em quartos alugados, durante uma grande parte da sua vida, Pessoa teve a família reunida de novo - ele, a mãe, que morreu em 1925, a meia irmã e os dois meios irmãos.
 
 " Todas as cartas de amor são / Ridículas"


Todas as cartas de amor são
Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.
Também escrevi em meu tempo cartas de amor, 
Como as outras,
Ridículas.

As cartas de amor, se há amor, 
Têm de ser
Ridículas.

Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram 
Cartas de amor 
É que são
Ridículas.

Quem me dera no tempo em que escrevia 
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas.

A verdade é que hoje 
As minhas memórias 
Dessas cartas de amor 
É que são
Ridículas.

(Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas.)

Álvaro de Campos
21-10-1935 (aqui, Casa Fernando Pessoa)

Fernando Pessoa, marcador e colagem sobre papel vegetal, 1983. Desenho de Júlio Pomar - FCG, Centro de Arte Moderna, Lisboa
Fernando Pessoa e Almada Negreiros, marcador sobre papel vegetal, 1983. Desenho de Júlio Pomar - FCG, Centro de Arte Moderna, Lisboa

O poeta Fernando Pessoa, água-forte e água-tinta sobre papel, 1984. Gravura de Bartolomeu Cid dos Santos. - FCG, Centro de Arte Moderna, Lisboa
No decorrer dos anos, Fernando Pessoa acumulou milhares de escritos, como, contos, traduções, poesia, peças de teatro, horóscopos, em Inglês, Português e Francês. Na sua escrita utilizou diferentes suportes, folhas soltas, cadernos, sobrescritos, panfletos... Ao longo da sua breve vida como poeta, Pessoa desdobrou-se em múltiplas personalidades poéticas - Alberto Caeiro, Álvaro de Campos e Ricardo Reis - conhecidas como heterónimos, facultando-lhes personalidade, características físicas, opções políticas, profissão, biografia... 
No dia 21 de Outubro de 1935, escreve "Todas as cartas de amor são /Ridículas, último poema datado do seu heterónimo Álvaro de Campos.

"Há doenças piores que as doenças" 
 

Há doenças piores que as doenças,
Há dores que não doem, nem na alma,
Mas que são dolorosas mais que as outras.
Há angústias sonhadas mais reais
Que as que a vida nos traz, há sensações
Sentidas só com o imaginá-las
Que são mais nossas do que a nossa vida.
Há tanta cousa que, sem existir,
Existe, existe demoradamente,
E demoradamente é nossa e nós…
Por sobre o verdor turvo do amplo rio
Os circunflexos brancos das gaivotas…
Por sobre a alma o adejar inútil
Do que não foi, nem pôde ser, e é tudo.


Dá-me mais vinho, porque a vida é nada.


Fernando Pessoa
19-11-1935 (aqui, Casa Fernando Pessoa)
Fernando Pessoa, mármore branco de Estremoz. Escultura de Francisco Simões - Parque dos Poetas, Oeiras

Sonho de Fernando Pessoa, Debaixo de uma Latada numa Tarde de Verão, tinta acrílica sobre tela, 1982. Pintura de António Dacosta - FCG, Centro de Arte Moderna, Lisboa

Fernando Pessoa, bronze, 2005. Escultura de Lagoa Henriques. Café "A Brasileira", Lisboa
Subitamente, na sequência de febres e dores abdominais, Fernando Pessoa foi internado no dia 29 de Novembro de 1935, no Hospital de São Luís dos Franceses, em Lisboa, sendo-lhe diagnosticada "cólica hepática". No seu último poema português datado, "Há doenças piores que as doenças», o verso final implora: «Dá-me mais vinho, porque a vida é nada». Morreu por volta das 20 horas, no dia 30 de Novembro, com 47 anos de idade, em presença do seu primo e médico, Jaime de Andrade Neves. As suas últimas palavras escritas foram: "I know not what tomorrow will bring" ("Não sei o que o amanhã trará"). Foi enterrado no cemitério dos Prazeres. O seu vasto legado literário, acumulado numa grande arca onde guardava os seus escritos, ainda não está completamente tratado pelos estudiosos.


"Se depois de eu morrer, quiserem escrever a minha biografia"

Se depois de eu morrer, quiserem escrever a minha biografia,  
Não há nada mais simples
Tem só duas datas — a da minha nascença e a da minha morte.   
Entre uma e outra cousa todos os dias são meus.
Sou fácil de definir.
Vi como um danado.
Amei as coisas sem sentimentalidade nenhuma.  
Nunca tive um desejo que não pudesse realizar, porque nunca ceguei.  
Mesmo ouvir nunca foi para mim senão um acompanhamento de ver.    
Compreendi que as coisas são reais e todas diferentes umas das outras; 
Compreendi isto com os olhos, nunca com o pensamento. 
Compreender isto com o pensamento seria achá-las todas iguais.  
Um dia deu-me o sono como a qualquer criança.  
Fechei os olhos e dormi.  
Além disso, fui o único poeta da Natureza
 
Alberto Caeiro (aqui Casa Fernando Pessoa)

Fernando Pessoa, painel de azulejos, 1990. Projecto do pintor Júlio Pomar. Fábrica de Cerâmica Viúva Lamego. (Réplica de uma parte do revestimento da Estação de Metro de Alto dos Moinhos) - Museu Nacional do Azulejo
Mural Pessoa, tecido de algodão estampado, com um mural em azulejo representando o poeta Fernando Pessoa, e uma das suas frases: "Nós somos o tecido de que são feitos os sonhos". Padrão concebido para a decoração do Cacilheiro que a artista plástica Joana Vasconcelos transformou no pavilhão de Portugal, na Bienal de Veneza, 2013. - Vidal
Jaz morto e arrefece o menino de sua mãe, 1973, escultura de Clara Menéres - Dove's taste of the day

" O menino de sua mãe"

No plaino abandonado 
Que a morna brisa aquece, 
De balas traspassado — 
Duas, de lado a lado —,
Jaz morto, e arrefece.
 
Raia-lhe a farda o sangue. 
De braços estendidos, 
Alvo, louro, exangue, 
Fita com olhar langue 
E cego os céus perdidos.
 
Tão jovem! que jovem era! 
(Agora que idade tem?) 
Filho único, a mãe lhe dera 
Um nome e o mantivera: 
"O menino da sua mãe".
 
Caiu-lhe da algibeira 
A cigarreira breve. 
Dera-lhe a mãe. Está inteira 
E boa a cigarreira. 
Ele é que já não serve.
 
De outra algibeira, alada 
Ponta a roçar o solo, 
A brancura embainhada 
De um lenço... Deu-lho a criada 
Velha que o trouxe ao colo.
 
Lá longe, em casa, há a prece: 
"Que volte cedo, e bem!" 
(Malhas que o Império tece!) 
Jaz morto, e apodrece, 
O menino da sua mãe


Fernando Pessoa
Maio de 1926 (aqui Casa Fernando Pessoa)


Vestido feminino,com retrato do poeta Fernando Pessoa , seda branca, vidrilhos pretos e lantejoulas pretas. Doação de José Carlos, 1986 - Museu Nacional do Traje e da Moda

Carta a Ofélia Queiroz - 23 de Maio de 1920
 

Meu Bebezinho pequeno:

Hoje, depois de passar na tua rua, e de te ver, voltei atrás para te perguntar uma coisa; mas tu não apareceste.

O que te queria perguntar era o que fazias amanhã, em vista da greve dos eléctricos, que naturalmente não dura só hoje. Não te dispões, com certeza a ir até Belém a pé? O melhor é escreveres para Belém ao dono da fábrica, explicando porque razão — aliás evidente — tu não vais. Além de ser uma distância enorme para qualquer pessoa, é impossível para ti, que não és forte.

Acabo de escrever este parágrafo, e lembro-me que há comboios para Belém. Irás de comboio, Bebé. E onde tomas o comboio — em Santos, no apeadeiro? Talvez te seja difícil encontrar lugar ali, pois muita gente irá do Cais do Sodré — a gente que de manhã costuma encher os carros que vão na direcção de Belém, e que te torna difícil arranjar lugar de manhã.

Não sei o que faça, Bebezinho. Já perguntei aqui no Café Arcada, de onde te estou escrevendo, mas não sabem as horas dos comboios da linha de Cascais, nem têm horário.

Não quereria deixar de te ver, mas também não queria (pois amanhã tenho muito que fazer) perder tempo inutilmente indo procurar-te ou esperar-te a qualquer ponto onde não estejas, ou por onde não passes.

Escreve-me amanhã dizendo qualquer coisa, mas não esquecendo que tenho os dias muito ocupados.

Seja como for, passo amanhã na tua rua, ou às 10 para as 10 1/4 da manhã, ou — o que é mais certo — às 7 1/2 da tarde .

Fica assim combinado, Bebé?

Isto, salvo complicações que haja e me impeçam de aparecer.

Muitos beijinhos do teu



 Fernando

Aqui, Casa Fernando Pessoa
 



Fontes:
http://casafernandopessoa.cm-lisboa.pt/index.php?id=2233
https://pt.wikipedia.org/wiki/Fernando_Pessoa


segunda-feira, 17 de junho de 2013

Edificio com valor patrimonial, projectado pelo arquitecto Cassiano Branco, foi demolido

O edifício no gaveto da Praça João do Rio com a Avenida Almirante Reis, foi projectado por Cassiano Branco e construído nos anos 30. Praça João do Rio e Avenida Almirante Reis, c. 1953. Negativo de gelatina e prata sobre vidro. Foto de António Passaporte - Arquivo Municipal de Lisboa.                                   
O edifício no gaveto da Praça João do Rio com a Avenida Almirante Reis, foi parcialmente demolido, antes da fiscalização agir. 
A Câmara Municipal de Lisboa, proibira a demolição integral do edifício, condicionando a obra à manutenção da fachada. O imóvel - propriedade da Hotel do Aeroporto, Actividades Hoteleiras, SA -, apresentava apenas dois pisos em pé, quando o vice-presidente da câmara, Manuel Salgado, mandou embargar a obra, no dia 11 deste mês.

Construído nos anos 30 para habitação colectiva, o edifício projectado pelo arquitecto Cassiano Branco, encontra-se inscrito no Inventário Municipal do Património. Ao longo dos anos, o prédio devoluto, cujas portas e janelas estavam tapadas e as paredes cobertas por graffiti, evidenciava grande deterioração.

Prédio de habitação (1933 ?) no gaveto da Praça João do Rio com a Avenida Almirante Reis, nº 233. Projectado por Cassiano Branco. Foto 2012.
Após um primeiro projecto indeferido pela Câmara de Lisboa, os proprietários do imóvel, vêem aprovado pela autarquia (com 13 votos a favor e três abstenções) em 2009, um outro com o mesma finalidade, a construção de um hotel. O projecto considera a demolição total do interior e a construção de um piso suplementar, em mansarda. Porém, a proposta de aprovação, assinada por Manuel Salgado, prescreveu, a "manutenção das fachadas principais" pela empresa.

O hotel a construir, contará seis pisos acima do solo (como tinha o projecto de Cassiano Branco), mais o piso em água-furtada na zona da cobertura e três pisos subterrâneos
Aqui no Público, o artigo de José António Cerejo.

Prédio praticamente demolido, 15-06-2013 - Público

quinta-feira, 13 de junho de 2013

Registos de azulejos com a imagem de Santo António

Imagem 1 - Registo, Santo António pregando aos peixes, painel de 6 x 5 azulejos, faiança policroma, século XVII, oficina de Lisboa (?). Proveniência - Escadinhas do Jogo da Pela, Lisboa - Museu da Cidade

Originariamente limitados ao interior das igrejas, as figuras dos santos surgiram também no meio profano, realidade que poderá ser explicável pelo desenvolvimento do culto divino, fomentado pela Reforma Católica a partir da 2ª metade do século XVI. 

Os registos de azulejos, identificadores da religiosidade popular, são muito comuns na cidade de Lisboa. Invocadores de Jesus Cristo, da Sagrada Família, da Virgem e dos Santos, no intuito de proteger as casas e os seus moradores, posicionam-se nas fachadas das habitações, sobre a porta ou entre as janelas. Por vezes, surgem em átrios de edifícios, como é o caso de alguns prédios da baixa pombalina.

Imagem 2 - Registo representando Nossa Senhora da Conceição, painel de 6 x 6 azulejos, faiança policroma, 1650-1675, Lisboa. - Museu Nacional do Azulejo (Alguns destes "registos", (...) são um importante testemunho das alterações culturais e políticas desta época, reflectindo o incremento do culto mariano na Europa pós-Concílio de Trento, bem como o protagonismo que este assumiu após as Cortes celebradas em Lisboa no ano de 1646, nas quais D. João IV tomou Nossa Senhora da Conceição como padroeira do reino."  João Pedro Monteiro in "Um Gosto Português. O Uso do Azulejo no ´seculo XVII", pp. 264 ).
 
Registo representando Santo António, painel de 5 x 3 azulejos. Rua do Benformoso, nº 209, Anjos, Lisboa. Foto de Eduardo Portugal, 1949. Negativo de gelatina e prata em vidro - Arquivo Municipal de Lisboa
Ao longo dos tempos, as figurações iconográficas mais numerosas são as da Virgem (nas suas diversas invocações) e as de Santo António.
Muitas destas peças de azulejaria estão datadas - as mais antigas remontam ao século XVII -, constituindo um importante documento da evolução azulejar e da história de Lisboa.

A fonte de inspiração dos registos, fundamentou-se em gravuras de cariz erudito e composições pintadas por artistas conceituados. Produzidos em oficinas existentes na cidade, eram elaborados por artesãos sem escola, apresentando figuração provida de grande simplicidade (imagens 1 e 2). A policromia era usada com frequência, de acordo com os cânones de azulejaria da época, nas cores amarelo, laranja, azul, verde, sobre fundo branco, com demarcação do desenho a manganês.
 
Registo representando São Marçal e Santo António, painel de 10 x 9 azulejos. Rua dos Remédios, nº 145, Santo Estevão, Lisboa. Foto de Eduardo Portugal, 1949. Negativo de gelatina e prata em vidro - Arquivo Municipal de Lisboa
Santo António pregando aos peixes, painel de 8 x 6 azulejos, faiança, 1725-1745, Lisboa - Museu Nacional do Azulejo
Após o terramoto de 1755, o número de registos aumentou, para além das figurações da Virgem e de Santo António, foram representados S. Marçal, protector contra os incêndios, e S. Francisco de Borja, reconhecido oficialmente em 1755, patrono do reino contra os terramotos.

Na transição para o século XVIII, emerge a pintura em azul e branco. Os registos continuam a apresentar enquadramentos rectangulares, sendo visível o refinamento das molduras, definidas por composições exuberantes, com profusão de elementos decorativos como conchas, laços, flores e folhagens, buscando uma elegância requintada, reproduzindo por vezes elementos arquitectónicos, de influência rococó. Progressivamente, os emolduramentos aproximam-se da decoração da talha, onde predominam os concheados e se integram por vezes vasos e motivos de flores e folhas. 

Registo pombalino representando o Calvário, São Marçal e Santo António, painel de 11 x 7 azulejos, c. 1760-1775. Pintura a azul e branco. Proveniente da Rua de São Ciro, nº 22, Lisboa - Museu da Cidade (Composição rococó, inteiramente recortada, e envolvida por enquadramento concheado, formando três reservas onde se integra a figuração. Ao centro da base, sob o Calvário, a legenda S. dos Navegantes).
Santo António, painel de 11 x 11 azulejos, faiança, 1750-1775, Lisboa - Museu Nacional do Azulejo

Registo pombalino representando São Marçal, Virgem com o Menino e Santo António, azulejos, Travessa do Calado, Penha de França, Lisboa. Foto de Eduardo Portugal, 1950. Negativo de gelatina e prata em vidro - Arquivo Municipal de Lisboa

Os registos de final do século XVIII, representam frequentemente diversos santos dentro de uma mesma reserva. As figuras relevantes são colocadas no centro da composição e representadas numa escala distinta. O painel policromo datado de 1790 (imagem 9), com representações de Nossa Senhora da Conceição, S. Marçal, Santo António e S. Pedro de Alcântara, embora com filiação rococó, é já um manifesto da fase assinalada pelo neoclassicismo. Este estilo também conhecido por estilo D. Maria I, teve o seu período mais significativo na penúltima década do séc. XVIII. A refinada ornamentação é conseguida através de técnica pontilhista e caligráfica. Os ornatos geralmente constituídos por grinaldas, fitas, laços, discretas ramagens e por vezes vasos floridos, associam-se a medalhões com pintura interior em azul ou roxo no centro.

Imagem 9 - Registo representando Nossa Senhora da Conceição, São. Marçal, Santo António e São Pedro de Alcântara, painel de 10 x 5 azulejos, faiança, 1790. Real Fábrica de Louça, ao Rato (?), Lisboa. Proveniente da Rua de São Marçal nº 51, Lisboa - Museu Nacional do Azulejo

Imagem 10 - Registo representando Santo António e São Marçal, painel de 10 x 7 azulejos, faiança, século XVIII (finais). Pintor ceramista Francisco da Paula e Oliveira. Real Fábrica de Louça, ao Rato. Proveniente da Rua das Amoreiras, nº 44-48, Lisboa - Museu da Cidade
Outro exemplo de azulejos da fase neoclássica ou estilo D. Maria I, é o registo com as representações de Santo António e de São Marçal (imagem 10). Os ornatos são constituídos por grinaldas, discretas ramagens e vasos floridos. Sobre fundo amarelo, destacam-se dois medalhões, cujo interior se encontra pintado em azul e branco, com figuração dos santos, integrando paisagens. A decoração requintada integra no eixo da peça, um vaso florido sobre cartela onde se lê: RVA / NOUA DO PAINEL / DE / JEZVS MARIA JOZE.

A Real Fábrica de Louça, ao Rato, em Lisboa, foi o principal centro produtor dos registos de santos, entre 1774 e 1835. Das fábricas responsáveis pela produção de registos em Lisboa, desde meados do último quartel do século XIX e a segunda metade do século XX, identificam-se a Fábrica de Cerâmica Viúva Lamego, a Fábrica Sant’Ana, a Fábrica de Cerâmica Lusitânia e a Fábrica de Louça de Sacavém.
 
Registo representando São Francisco de Assis e Santo António, painel de 6 x 5 azulejos, c. 1790. Figuração com pintura em azul e branco. Proveniente da Travessa das Fiandeiras, Ajuda, Lisboa - Museu da Cidade (Decoração envolvente policroma, recortada na parte superior, com duas urnas laterais e um cesto ao centro, do qual se espalham grinaldas. Na base, duas fitas com as legendas, formando um laço, no centro).
Nossa Senhora da Conceição, São Marçal e Santo António (?), painel de 14 x 11 azulejos, 1760 - Colecção Berardo
Registo representando Santo António, painel de 9 x 6 azulejos. Travessa de Santo António à Graça, nº 3, Graça, Lisboa. Foto de Eduardo Portugal, 1953. Negativo de gelatina e prata em vidro - Arquivo Municipal de Lisboa
A tradição dos registos foi retomada durante o romantismo, depois de sofrer oscilações relacionadas com crises políticas e questões de ordem sócio-económica, decorrentes das Guerras Liberais do 1º terço do século XIX.
Após o periodo anticlerical da 1º República, os registos entram numa nova fase, reflectindo por vezes as circunstâncias sociais e políticas do momento. Durante o Estado Novo, em conjuntos urbanos distintos,p revaleceram os santos  adoptados pela política do Regime. Destacam-se entre eles, Santa Isabel e S. Francisco de Assis, pela sua vertente caridosa, a Sagrada Família, e a Nossa Senhora de Fátima, que ao longo do século XX vai ganhando realce
 
Em Lisboa, os registos em azulejo são abundantes, destacando-se a riqueza e diversidade iconográfica. A negligência, os roubos e os actos de vandalismo, colocam em risco este património histórico-cultural da cidade.

 
Nossa Senhora das Sete Dores, São Marçal, Santo António com Menino e Almas do Purgatório, painel de 9 x 7 azulejos, faiança policroma, 1800. Real Fábrica de Louça, ao Rato, Lisboa - Museu Nacional do Azulejo

São Marçal e Santo António (?), painel de 11 x 7 azulejos, 1807 - Colecção Berardo

Registo de santos votivo a São Marçal, Nossa Senhora da Conceição, e Santo António, painel de azulejos. Rua de São João da Praça, nº 15, Sé, Lisboa. Foto de Armando Serodio, 1960. Negativo de gelatina e prata em acetato de celulose - Arquivo Municipal de Lisboa

Fonte:
http://www.museudacidade.pt/Paginas/Default.aspx
Câmara Municipal de Lisboa (1984), Exposição Azulejos de Lisboa. Lisboa: Ramos, Afonso & Moita Lda.